quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Dívidas dos trabalhadores/as a Recibos Verdes à Segurança Social


Antes da dívida temos direitos!


A deterioração das relações laborais avança em Portugal a um ritmo avassalador, com perda de direitos e erosão das condições de vida para sectores cada vez mais vastos da população. A par do aumento do desemprego, há hoje cerca de 2 milhões de pessoas em situação de precariedade, sujeitas à arbitrariedade dos patrões, obrigadas a aceitar os baixos salários e a incerteza, à margem do enquadramento legal, da protecção social e das garantias mínimas. A chantagem social individualiza as relações laborais para enfraquecer a parte mais fraca: os trabalhadores/as.

Assistimos à generalização da contratualização a prazo para funções permanentes, à vulgarização dos recibos verdes, ao crescimento do negócio das empresas de trabalho temporário, à transformação dos/as trabalhadores/as em “colaboradores/as”, sempre disponíveis e descartáveis.

O trabalho a recibos verdes é disso um bom exemplo: estima-se que existam hoje em Portugal cerca de 900 mil falsos recibos verdes, a desempenhar funções permanentes, com horário, local de trabalho e hierarquia reconhecíveis, mas sem qualquer contrato ou reconhecimento de direitos.

O Estado, que deveria ter uma responsabilidade especial nesta matéria - desde logo fiscalizando e impedindo esta chantagem ilegal sobre um conjunto cada vez maior de trabalhadores/as -, é o primeiro a não dar o exemplo: além dos meios insuficientes fornecidos à Autoridade para as Condições do Trabalho, há já hoje mais de 100 mil pessoas a trabalhar com vínculos precários em funções públicas.

A Segurança Social, uma conquista histórica e social que deveria garantir a solidariedade entre gerações e assegurar o apoio a todos/as em situação de vulnerabilidade, exclui hoje um número crescente de trabalhadores/as. Os/as trabalhadores/as sujeitos/as à ilegalidade dos falsos recibos verdes, quase sempre com baixos salários, contribuem para a Segurança Social, mas quase sem contrapartidas.

É neste contexto que muitas vezes estes/as trabalhadores/as têm de escolher entre cumprir com as suas contribuições para a Segurança Social ou fazer face às dificuldades do quotidiano.

Assim, há hoje milhares de trabalhadores/as a recibos verdes que viram acumular-se uma dívida à Segurança Social, que, nas suas condições, não conseguem saldar. Uma dívida quase sempre contraída numa situação que, além de injusta, é ilegal. É uma dívida contraída porque os patrões não descontaram o que deveriam, se a esse trabalho correspondesse o contrato de trabalho devido; é uma dívida contraída por milhares de pessoas que nunca tiveram direito aos subsídios de férias ou de Natal; é uma dívida contraída por pessoas que, por serem cinicamente consideradas empresários/as, nunca tiveram apoio na doença ou no desemprego.

A Segurança Social é uma conquista que não queremos perder. Queremos defendê-la, para que ela seja uma garantia solidária que nos proteja nas dificuldades e nos dê segurança quando olhamos para o presente e o futuro. Sabemos que os sucessivos Governos a têm vindo a esvaziar e afirmamos que nos bateremos por ela e pelo seu aprofundamento, capacidade e dotação. Uma sociedade com direitos no trabalho e na vida não pode dispensar uma Segurança Social forte e universal.

É por isso que dizemos que, quando olhamos para as dívidas destes/as trabalhadores/as à Segurança Social, se têm de fazer contas. O Estado permitiu a instalação confortável do abuso e da ilegalidade nas relações laborais. Não pode agora executar cegamente estas dívidas.

Assim, porque queremos uma Segurança Social forte, a que corresponda uma sociedade com direitos no trabalho e na vida, e porque não aceitamos que seja a própria Segurança Social a tornar-se uma forma de chantagem para os/as trabalhadores/as, exigimos que as dívidas contraídas por estes/as trabalhadores/as não possam ser executadas sem que sejam averiguadas as condições nas quais elas foram contraídas. Fazer as contas tem de ser um momento esclarecedor e rigoroso: a dívida daqueles/as a quem são devidos direitos há anos, tem que ser equacionada mediante a avaliação da responsabilidade dos que lucraram com a sobre-exploração do seu trabalho.

Esta proposta é incontornável na medida em que identifica (e pretende resolver) uma perversão no modo como se usa e abusa da legislação que autoriza a existência dos recibos verdes, que tem vindo a ser utilizada por um número cada vez maior de entidades empregadoras. O Estado tem que falar e terminar com as ilegalidades e injustiças a que se têm de sujeitar cada vez mais pessoas, desde logo na Segurança Social. Por isso, afirmamos: antes da dívida, temos direitos!


APRE! – Activistas Precários
FERVE- Fartos/as d’Estes Recibos Verdes
Plataforma dos Intermitentes do Espectáculo e do Audiovisual
Precários Inflexíveis



4 comentários:

  1. A sociedade Portuguesa dos nossos dias consegue ser tão corrosiva como a idade média. Continua a haver feudos e servos da gleba, enquanto uns enchem a pança à conta do contribuinte, o comum dos mortais que mais nada procura que uma vida normal, é positivamente trucidado por regras idiotas em nome de uma produtividade que teima e há-de continuar ancorada à cauda da Europa.

    Os nossos políticos nada fazem, nem nada hão-de fazer. Não dá jeito. Não se pode fiscalizar nem investigar muito, sob o risco de serem varados numa qualquer infeliz coincidência. E nenhum deles está preparado para meter a carne no assador quando chega a hora da verdade. Mesmo aqueles à esquerda que passam a vida a pregar sobre o assunto no Parlamento ou na TV.

    O nosso país não tem remédio, para grande tristeza minha. Aguardam-no muitos anos de pobreza e de saque continuado ao orçamento. Essa é a lógica – quanto maior a pobreza, maior será a propensão à corrupção. E mais serão aqueles dispostos a pisar o risco para dar uma educação melhor aos filhos. Porque o poder corrompe. A esperança já se foi-se toda nos bolsos dos autarcas, banqueiros e lobby do betão.

    Quem tem amor à sua família, tome o único acto responsável que pode fazer por eles. Olhe demoradamente para um mapa mundo, e emigre. Para não voltar mais.

    The end

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  2. Subscrevo.

    Parabéns pela vossa iniciativa. Esperemos que vença!

    Sugiro: podem deslocar membros ou enviar os documentos para a petição pelo correio electrónico?
    Muitos desses trabalhadores e outros que estão em solidariedade com esses, não poderão deslocar-se a Lisboa.

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  3. Subscrevo inteiramente, tenho tristeza em dize-lo. Já ha 6 anos que estou fora do pais e é assim que eu o vejo...Nos piores assuntos, somos comparáveis ao mexico, burundi, quénia, somalia...só que uma maneira mais polida, mais...civilizada...
    A nossa essencia esta podre

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  4. a menção de paises nao reflete nenhuma xenofobia especial, podia ter referido outros, que era igual. o problema está nos humanos que os povoam e nisso a avareza e egoismo humano é muito semelhante por todo o lado

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